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A juventude brasileira hoje: O passado, o presente e o futuro de nossas lutas


A Juventude da Comuna esteve reunida na cidade de Niterói entre os dias 28 de fevereiro e 01 de março para o seu 1º Ativo Nacional de Juventude. O espaço foi uma oportunidade ímpar de nos reconhecermos como jovens e compartilharmos nossas vivências e nossas lutas. Esse texto é o resultado do acúmulo de alguns de nossos debates, de nossos encontros, de nossas vivências. Não acreditamos que o presente se faz do agora, mas sim do acúmulo de tudo o que vivemos, a leitura de como a história nos entrecorta. Também não acreditamos que o presente deva terminar em si mesmo. O presente é como uma jangada: a estrutura, por vezes frágil, na qual nos apoiamos, movida pelos ventos da história, mas buscando navegar até o horizonte, o horizonte do futuro em que queremos chegar. Se a juventude alcançará esse futuro, depende menos da força do vento, e mais de como conduzimos esse sopro. Depende de nós.


A juventude sob massacre


A acentuação do neoliberalismo como linguagem global do capitalismo encontrou na juventude um de seus principais alvos. Ao redor do planeta, jovens extremamente precarizados são esmagados seja pelo trabalho cada vez mais desregulado e predatório, seja pela miséria do desemprego. Na sociologia brasileira, um intenso debate quanto ao termo “precariado” passa a ser adotado para descrever esta situação. Ruy Braga caracteriza o “precariado” como a massa de trabalhadores em condições de trabalho extremamente precarizadas. Giovanni Alves usa o termo para descrever os trabalhadores jovens qualificados que trabalham em condições mais proletarizadas. Opositor do uso da categoria, Ricardo Antunes versará sobre um “novo precariado de serviços”. Somos avessos à ideia de que a existência de um “precariado” represente uma “nova classe”, mas entendemos que existem mudanças importantes na classe trabalhadora, especialmente a jovem, que merecem atenção. E essas mudanças perpassam elementos presentes nos discursos das três concepções apresentadas: redução de direitos, de salário, de qualidade de vida. Juventude sob massacre.


Nos governos petistas, esse processo era bastante demarcado pelos trabalhadores de call-centers. O crescimento exponencial da categoria (182% entre 2003 e 2009!) é marcado pela presença numerosa de jovens, especialmente “mulheres negras”. Assim se deu o aumento de trabalho na Era PT, por meio do crescimento da precarização das condições de trabalho. Essa precarização está essencialmente relacionada à desvinculação dos indivíduos das associações formais de solidariedade, como sindicatos. Assim, a relação de trabalho é feita diretamente do sujeito para o patrão, sem garantias e extremamente vinculado a metas. Se pudermos fazer um salto temporal, esse processo se intensificou ainda mais nos dias de hoje com a chamada uberização do trabalho, também muito presente entre jovens. Motoristas e entregadores de aplicativo que oficialmente “trabalham para si mesmos” mas, na prática, vendem sua vida para grandes corporações que pagam valores miseráveis sem obrigarem-se a entregar qualquer condição digna de trabalho. Esse é o jovem precariado, sujeito revolucionário do século XXI.


ssa precarização também é presente no ensino. Muito se diz sobre a expansão universitária nos governos do PT. De fato, o número de jovens cursando o ensino superior aumentou de maneira considerável, mas boa parte destes entraram em faculdades privadas de baixa qualidade, em um amplo processo de transferência de recursos público para a esfera privada. Além disso, cresce o modelo de Ensino a Distância, especialmente a partir de grandes grupos, como Kroton e Anglo, de capital aberto na bolsa de valores. Vale aqui uma reflexão política: quais são os efeitos de facilitar o acesso ao diploma superior sem que isso signifique uma formação de qualidade ou mesmo uma garantia mínima de empregabilidade qualificada? O jovem realizou o sonho do diploma, mas parou na porta do desemprego.


A crise de 2008 é uma espécie de núcleo crítico de todo esse processo. A ganância dos rentistas de Wall Street implode a maior economia do mundo capitalista, provocando um efeito “cascata” que atingiu o planeta inteiro. Mesmo com todos os alertas que um modelo econômico focado na acumulação e na retirada de direitos sociais em prol da capacidade do “indivíduo” de “prover sua própria seguridade” levaria a civilização mais próxima do colapso [cadafalso]. Nos Estados Unidos, centenas de milhares de pessoas ficaram sem as suas casas, tendo de ir morar em acampamentos ou mesmo na rua. Os índices de desemprego no país alcançaram números alarmantes. Enquanto isso, o governo preocupava-se mais em socorrer bancos e instituições financeiras que, segundo eles, seriam “grandes demais para falir”. A juventude, revoltada, foi à luta. Em 2008, os islandeses foram às ruas condenar o auxílio aos grandes grupos financeiros. Em março de 2011, foi a vez dos portugueses. Um pouco depois, em maio, os espanhóis ocuparam praças de todo o país no movimento chamado de Indignados. E em setembro daquele ano, a juventude estadunidense ocupou Wall Street, epicentro da crise mundial.


A crise não chegou de imediato ao Brasil, que vivia um momento de aparente estabilidade econômica. Entretanto, esse discurso serviu para mascarar o que realmente ocorria no país. As cidades cada vez mais difíceis de viver para os que são de baixo no estrato social, a violência policial crescente contra a juventude negra, a população para a qual a democracia nunca se consolidou e que vive sob genocídio permanente. O Brasil estava, nesse momento, construindo e consolidando a política do encarceramento em massa, que funciona como um instrumento de controle da classe trabalhadora e se manifesta como uma das principais heranças da escravidão da população negra no Brasil.


Nas favelas, uma “pacificação” sustentada no sangue dos que ali vivem. Enquanto isso, as metrópoles sendo hiper privatizadas em uma lógica de “modernização” que nada servia para a população, e sim para o capital especulativo que patrocinava os megaeventos esportivos que estavam para vir. Em todo o país, cresciam greves e ocupações dos mais diversos tipos. Um verdadeiro caldeirão em ebulição.


Que, em 2013, explodiu.


Houve luta.


No Brasil, a emergência de alternativas radicais se expressou especialmente em 2013, momento em que milhões de pessoas foram às ruas protestar, sobretudo, contra o desordenado e caro sistema de transporte público das grandes metrópoles. Seguidamente, a revolta popular por intermédio desses atos foi apontada como sendo dispersa e detentora de pouco entendimento de pauta. Quando muito pelo contrário, a pauta era suficientemente clara: a inviabilidade de se viver sob um sistema capitalista, sistema esse que era especificamente combinado com o neoliberalismo e precarização de vida. Junho de 2013 tornou evidente a incapacidade do capitalismo de articular ações/contribuir com respostas para os problemas da sociedade.


A análise deste cenário nos permite refletir a forma com que nossa estratégia se encaminha para uma radicalidade anti sistêmica disruptiva autônoma. Com isso, queremos afirmar uma política radical e independente (no que se refere aos partidos da ordem, de esquerda e de direita) como uma necessidade. Em outros termos, a indispensabilidade de uma esquerda “contra a ordem”. Com base em todos esses reflexos que ocorreram em Junho de 2013 e que se perpetuam até os dias atuais, torna-se cada vez possível a visualização do “modelo” de juventude que também precisamos ser. Temos a urgência de sermos uma juventude que se identifica abertamente com um projeto que vise a independência da sociedade: um projeto comunista.


Sendo de grande necessidade o resgate de jornadas vivenciadas em Junho de 2013 e de outras expressões de lutas da juventude para que seja possível nos familiarizar e reafirmamos tamanha rebeldia. Quanto a Junho de 2013 podemos citar o relato de Alessandra Lohana, auxiliar de enfermagem, de 21 anos, moradora de Taboão da Serra, que trabalha e estuda na capital paulista “A vida do trabalhador não é fácil. Acordar cedo, ir trabalhar, depois ir para a universidade, voltar tarde para casa, é tudo corrido e cada vez mais se gasta mais com transporte. Viemos aqui para nos unir a todos estes jovens. É uma causa de todos, que vai além de do transporte”, disse Alessandra. Essa foi apenas uma das milhares de vivências relatadas, a multidão que foi para as ruas detinha de uma gigantesca diversidade, com variáveis idades, bairros, profissões, ideologias e opiniões sobre o tema.


Podemos mencionar também a primavera feminista de 2015. Com o ajuste fiscal com profundos cortes no orçamento das áreas sociais, as mulheres tornaram-se um dos setores especialmente afetados. Isso porque são elas que enfrentam a maior rotatividade no mercado de trabalho, desigualdade salarial, ocupação de cargos precarizados (como os terceirizados), etc. Além disso,também tiveram os impactos sofridos pelos cortes na Educação, Saúde e o fechamento da Secretaria de Políticas para as Mulheres e a diminuição do repasse para combater a violência contra a mulher. Como se não bastasse todos esses ataques, tínhamos como “cabeça” do parlamento brasileiro um dos maiores inimigos das mulheres: Eduardo Cunha (PMDB).


Enquanto presidente da Câmara, Cunha realizava reuniões com bancadas mais conservadoras para aprovar diversas medidas que respondessem (quase que unicamente) aos interesses corporativos desses setores. Entre tais medidas estava o PL 5069/2013 (Projeto de Lei que altera o entendimento sobre o que se considera violência sexual, entre outros.). Em época bem próxima ao lançamento do PL, a prova de redação do ENEM contou com o tema “Violência Contra a Mulher” e isso levantou gigantesco fervor, principalmente por se passar em tempos de constantes ataques aos direitos das mulheres. Na mesma semana ocorreu uma explosão de relatos no Facebook com a hashtag #MeuPrimeiroAssédio (em que mulheres sentiram-se encorajadas para publicizar sua primeira experiência de assédio). Também foi organizado nas redes sociais a campanha “Pílula fica, Cunha sai! #ForaCunha” (posição contrária à aprovação da PL 5069).


O perfil destes atos remeteu ao perfis de Junho de 2013, porém reunindo agora uma vanguarda majoritariamente feminina. Demonstrando ser um importante setor organizado, capaz de dar resposta à crise econômica e política do país. Sendo assim, a reorganização do movimento feminista foi e continua sendo estratégico para a construção de uma alternativa política no país.


A Primavera Secundarista foi outra luta importantíssima da juventude e merecedora de ser relembrada,sendo marcada pelas ocupações de mais de mil escolas por todo o território brasileiro,com estopim no segundo semestre de 2016. Os estudantes começaram a organizar-se autonomamente em contraposição à PEC 241. O projeto visava limitar o teto de gastos públicos, afetando o investimento em educação no país. Assim, os jovens secundaristas se colocaram à frente da defesa de seus direitos e pela reafirmação do espaço escolar que estava ameaçado a ser fechado. Além da luta contra o fechamento das escolas, tinha-se uma mobilização em massa criticando o sistema de representação política e defendendo a pauta de ampliação, consolidação e defesa dos direitos sociais. Vale ressaltar que toda essa movimentação por parte dos secundaristas não foi realizada por meio da ação de partidos políticos, mas sim por meio de luta direta, sem intermediação de partidos.


Uma das características mais belas destas ocupações certamente foram as preocupações e cuidados com a escola de modo em geral. Estudantes limparam, pintaram, fizeram pequenas reformas nas escolas (como o conserto de portas), criaram bibliotecas comunitárias, trouxeram palestras e oficinas, realizaram batalhas de MC’s e aulões. Essa juventude experimentou a diversidade de possibilidades que a vida é/pode ser, mesmo sob o jugo das constantes opressões policiais que os vitimavam naquele espaço. O movimento teve demandas bastante concretas e por fim conseguiu uma vitória com a abertura da CPI da Merenda na Assembleia Legislativa de São Paulo. Não somente isso, algumas escolas que anteriormente não recebiam merenda passaram a receber, o governo também prometeu construir refeitórios em várias escolas.


Todos esses protestos denotam uma indignação contra um modelo de vida, esses jovens não se veem nos modelos institucionais da política e isso os leva, muitas vezes, a agir na radicalidade. Devemos considerar a juventude como um momento transitório, instante esse que permite experimentação de inúmeras possibilidades de vivências, de encontrar espaço no mundo, de lutar por justiça e liberdade mesmo que com perspectivas e esperanças tão baixas.


Nossa tarefa então é clara: ser uma organização que se alimenta da rebeldia dos precários, ao mesmo tempo em que orienta esta rebeldia à luta socialista. É um desafio que nos propomos a cumprir.


Juventude e Bolsonarismo.


Infelizmente, sob muitos aspectos, a esquerda brasileira falhou em cumprir este papel. Ainda presa às narrativas petistas de defesa do Estado, permitirmos que boa parte desta rebeldia fosse canalizada pelo crescente movimento de Extrema Direita, que se sustenta na falsificação de uma indignação anti sistêmica que historicamente pertence aos socialistas revolucionários. Em 2017, uma pesquisa do Datafolha apontou que 60% dos eleitores do então pré-candidato à presidência da República Jair Bolsonaro, do até então PSL, tinham entre 16 e 34 anos. A lógica maniqueísta presente na sociedade (e até mesmo em setores da esquerda) e a dificuldade por parte dos setores petistas em realizar autocrítica para compreender a razão do descolamento de parte da sua base, sugeria que, impreterivelmente, essa grande parcela de jovens era ligada aos signos protofascistas. Todavia, essa breve reflexão busca se afastar dessa análise simplista, trazendo à luz aspectos do cotidiano para buscar entender esse movimento presente na juventude brasileira.


Após a eleição de 2018, muito se falou sobre o conceito de uma “onda” conservadora juvenil. Consideramos esse conceito um tanto quanto oco, pois ele remete a algo fluido e sem precedentes. Na verdade, o que ocorre é um processo paulatino de construção de uma nova direita há pelo menos 10 anos, sendo, porque não, bastante enraizada em setores da sociedade civil. Esse processo acontece concomitantemente aos governos petistas, marcados, respectivamente, pela emergência do crescimento econômico e pelo seu colapso. Governos marcados também pela forte desmobilização das bases coletivas e pela adoção de políticas liberais, acarretando um enfraquecimento da democracia burguesa e uma despolitização em larga escala.


Após as já citadas Jornadas de Junho de 2013, se constituiu um cenário em disputa na formação de novas oportunidades políticas e de mobilizações para os jovens. De um lado, a proliferação de coletivos negros, LGBTs, feministas e as ocupações das escolas, marcadas pelo alto grau de descentralização e horizontalidade. Do outro, movimentos costumeiramente chamados de “nova direita” – a maioria com financiamento de corporações -, tensionados, principalmente, a partir da internet e fóruns virtuais, fortemente balizados nos valores éticos e morais, sendo favorecidos pelos escândalos de corrupção que permeavam os governos petistas.


Somado a este contexto, a crise econômica que se agravava no país desde 2014, o impeachment da então presidenta Dilma Rousseff em 2016 e a consequente agenda antissocial aplicadas por Michel Temer, criou um ambiente favorável para oportunistas políticos – como a família Bolsonaro - disseminarem discursos de ódio por trás de slogans conservadores e moralistas, se alimentando, especialmente, de notícias falsas impulsionadas via redes sociais, e, também, defenderem uma perspectiva anti sistêmica que buscava se descolar nos partidos tradicionais e do modus operandi político.


Por fim desta breve reflexão, frisamos dois pontos. O primeiro é que este debate não encerra aqui, compreendendo que estes são apenas alguns fatores e eventos que nos auxiliam a pensar na complexidade das relações nas juventudes, sendo elas demarcadas por diversos outros elementos, como classe, raça, gênero e experiências de socialização distintas. No segundo ponto, é fundamental destacar que ao mesmo tempo em que há uma adesão de parcelas da juventude ao bolsonarismo, também existe um crescimento de movimentos de contestação, como os coletivos feministas e LGBTs, e o aumento dos Grêmio Estudantis. Além destas, também é importante ressaltar outras manifestações nas juventudes que se colocaram como alternativas de resistência a este crescimento conservador na sociedade, como é o caso da cultura marginal através de diversos expoentes, como a pixação e do RAP.


É importante compreender a presença do bolsonarismo na juventude como um movimento que alinha, ao mesmo tempo, a presença ideológica-estrutural do capital, afastando os jovens da esquerda política e os aproximando de camadas conservadoras; com um movimento legítimo de indignação anti sistêmica que não encontrou eco suficiente na esquerda brasileira. Reconhecer o nosso papel histórico e nossas limitações nesse processo nos afasta de adotar narrativas maniqueístas que tendem a ler os jovens que apoiaram Bolsonaro simplesmente como “maus”. Precisamos constituir uma juventude que possa servir de guarda-chuva para toda essa indignação, ajudando para que ela se direcione para o verdadeiro inimigo: o capital, que tanto massacra a juventude.


Há lutas. Haverá mais.


Quando falamos nos excertos anteriores das lutas que surgiram a partir de 2013, tratamos de falar em “autonomia” como uma categoria importante. Pois, sentimentos de independência política, autonomia e horizontalidade ganharam força e necessidade de serem colocadas em prática no dia a dia da luta. Acabando por entidades (UNE, UBES, ANPG), associações estudantis, entidades de base (DCEs, CAs) e agremiações políticas terem suas validades contestadas em algum grau, e nem sempre a resposta dada foi a que melhor resolveu os anseios desta juventude.


Dito isso, nos encontramos em um cenário de intensos desafios: se por um lado é preciso reafirmar a necessidade de espaços de organização política, pois só através deles podemos alimentar a dinâmica da luta contra o projeto "liberal-conservador" do atual governo; por outro não há mais como aceitar a prática da institucionalização e da burocratização que tais espaços relegam aos jovens. Estes desafios se vêem, na prática, quando pensamos o que foi o Movimento Estudantil neste último ano do governo Bolsonaro. Total engessamento e sem grandes campanhas unitárias convocadas pela UNE. Com o corte de diversas bolsas da CNPQ e da Capes, se fomentou uma mobilização de base real, mas que com o passar do tempo foi esvaziada. Com isso, projetos de militarização do ensino básico, cortes gigantescos na pós-graduação, precarização das universidades públicas, perda da autonomia universitária, erros no Enem e Sisu, e diversos outros ataques ocorrem e as entidades não dão as respostas necessárias, de radicalização e enfrentamento para a derrubada do Weintraub, Bolsonaro e seu projeto político.


Mas claro que houve mobilização, um dos grandes acertos foram os “Tsunamis pela Educação” em 2019, porém foi uma movimentação claramente insuficiente, pois a UNE, atrelada aos interesses dos governos ao longo dos mandatos do PT, há anos não mobiliza e impulsiona ações radicais. Como exemplo tivemos a falta de mobilização da entidade diante das reformas trabalhistas e previdenciárias. Qual será a nossa saída diante disso? A juventude, assim como toda a parcela da população brasileira, se vê encurralada com tantos ataques aos seus direitos, o que causa, muitas vezes, a sensação de total impotência das suas ações e um grande descrédito na mobilização popular. Porém, é tarefa de uma juventude organizada não cair nessas armadilhas.


Já que o Movimento Estudantil se encontra nestas encruzilhadas, devemos nos inspirar em outras lutas nas quais a juventude é protagonista, com o fim de reoxigenar nossa prática. O primeiro exemplo é a luta ambiental, desde o início do desgoverno e Bolsonaro, os ataques à natureza, aos povos originários, desmatamento da Amazônia, o racismo ambiental e diversas outras formas de avanço do capital contra o meio ambiente se intensificaram em um nível jamais visto. O céu de São Paulo anoitece durante o dia com a fumaça das queimadas na Amazônia, nossas praias e nosso mar são tomados por óleo, um vazamento de petróleo não explicado até agora. Vivemos um mundo distópico, aqui e agora, pois a resposta do governo a tais eventos, foi alegar "incapacidade". Mas, não nos enganarão, sabemos que essas práticas são intencionais e criminosas. Como resposta, diversos atos em defesa da Amazônia surgiram de maneira espontânea e tomaram o país, além disso, a pauta ambiental a nível internacional nunca ganhou tanto destaque, quanto após o surgimento da figura da Greta Thuberg, com sua greve pelo clima realizada toda sexta-feira, que ganhou o mundo. Uma das consequências dessas mobilizações foi o surgimento de Coalizões Pelo Clima em várias cidades, a fim de ter um movimento constante das pautas regionais e fortalecimento da luta ambiental de base. Com prática horizontal, aberta a todos e todas, porém sempre reafirmando sua veia anticapitalista. O ecossocialismo surge como única resposta possível para tais sofrimentos da classe, portanto, uma juventude enraizada nessa causa é fundamental.


Outra frente de atuação que nos dá bons exemplos de enfrentamento ao bolsonarismo é a luta pela legalização das drogas. Abarcando no seu guarda chuva, a luta pelo desencarceramento, o abolicionismo penal, a luta antimanicomial e seu mote pelo fim da guerra aos pobres! A lógica da guerra às drogas é absurda e terrível, pois coloca nossa juventude acuada, por um lado, pelo Estado praticando genocídio e, por outro, pelo tráfico que, apesar de oferecer uma vida curta, para muitos jovens aparece como única possibilidade de trabalho. Desta forma, toda mobilização que vise o fim desta guerra, deve buscar a emancipação da nossa juventude negra e periférica. As Marchas da Maconha a cada ano acontecem em mais cidades pelo Brasil, mostrando toda sua força e capacidade de mobilização. Enquanto o governo do Bolsonaro busca a criminalização e uma intensificação do genocídio, junto com os governadores, nossa resposta é a luta pela vida e pela liberdade da juventude.


Por fim, precisamos alertar para os perigos do crescimento de uma juventude que pratica um abrandamento do balanço histórico quanto ao stalinismo. Parte deste crescimento se sustenta por meio de uma política "memética", que tem na internet como sua maior ferramenta. O resultado desta cultura política é o impedimento do debate de ideias com “vitórias intelectuais” sustentadas em frases vazias e mentiras históricas. Mas não acreditamos que o crescimento deste tipo de filiação política surge do nada. As organizações “stalinizadas” não crescem porque cresce o pensamento stalinista entre os jovens, o processo é inverso. Formação política e bom manejo das ferramentas comunicacionais são lições que nós trotskistas precisamos urgentemente aplicar frente à juventude. O mesmo vale, aliás, para a juventude lulo-petista, que vê na exaltação das experiências dos governos Lula e Dilma uma espécie de escudo contra o crescimento da extrema direita. Como este texto procurou evidenciar em seus itens anteriores, o que ocorre é o contrário: quanto mais jovens se filiarem a esse tipo de visão, menos seremos capazes de captar o sentimento de radicalidade presente na juventude brasileira.


Quatro signos, muito diferentes, aparecem nas lutas hoje então. O autonomismo, o bolsonarismo, o stalinismo e o lulo-petismo. É necessário constituir uma juventude internacionalista, revolucionária, democrática e libertária. Profundamente enraizada no ecossocialismo e nas lutas antirracistas, antilgbtfóbicas e feministas. Um movimento quente, pulsante e organizado. Com isso, teremos a capacidade de nos apresentarmos como uma organização capaz de ajudar a orientar as lutas espontâneas e autônomas à organização revolucionária, sem perder o nosso viés eminentemente antiburocrático. Teremos a capacidade de dialogar com a radicalidade de parcelas importantes da juventude bolsonarista, sem recair no discurso conservador da extrema-direita. E seremos socialistas, forjados sob o signo da luta de classes, sem deixar de combater as mentiras e distorções, seja dos stalinistas, seja do lulo-petismo. Insubordinados, ecoaremos esse grito de luta.

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